30.5.08

Onde há fumaça há propaganda

Eu sempre gostei de comerciais de tevê. Nem sempre pelo poder de convencimento de vender um determinado produto (até porque quando isto acontece acho que a gente nem se dá conta). O que me chama atenção mesmo são as grandes sacadas, textos fenomenais ou fotografia exuberante. É aquela sensação do tipo "por que diabos eu não pensei nisto antes?" que só grandes comerciais sabem produzir na gente.

Os extintos comerciais de cigarros sempre mexeram com a minha curiosidade. A gente perde a noção do tempo. Na minha percepção, parece que eu vi o último comercial de cigarros 20 atrás. Mas a proibição é muito recente: de 2001.

O cigarro é um vício curioso. Acho que todo mundo em uma determinada época da vida experimenta. A influência vem de todos os cantos. Dos familiares, dos amigos e, antigamente, das propagandas. Eu fui de uma geração que recebeu todas essas influências e o que aconteceu? Virei fumante. Foram dez anos esfumaçados. Parei há quatro porque percebi que o casamento com uma não-fumante seria mais feliz sem o tabaco entre nós.

Eu estou longe de ser daqueles chatos que depois que param de fumar viram ativistas anti-tabaco. Acho que as pessoas têm o direito de fazer o que quiserem de suas vidas. Ninguém em sã consciência fuma desavisado dos riscos do tabaco. Mas eu tenho que admitir que uma vida sem cigarro é muito mais saudável, além de proporcionar outros prazeres. Como o de não viver cheirando a cinzeiro.

Mas falava de comerciais. Eu achava fantástica a cara-de-pau das agências de propaganda, que vendiam um produto tóxico-cancerígeno como a quinta maravilha do mundo. Nos comerciais de cigarro as pessoas praticavam esportes, se aventuravam, eram espertas, inteligentes, descoladas. Enfim, quase não me culpo por ter começado a fumar. Quem não queria ser tudo o que os comerciais mostravam? Além disso havia a aceitação social. Afinal, todos os meus amigos fumavam. Leva um tempo até a gente se dar conta disso.

Outro viés fantástico dos comerciais de cigarro era a roupagem que cada marca recebia. Tecnicamente cigarro é tudo igual. Um fumante sem cigarros irá aceitar qualquer marca que lhe oferecerem. A diferença está na concentração de nicotina de cada um, que vai desde o "light" até o estoura peito. Mas há também (ou havia, não sei como isso ficou depois que os comerciais foram banidos) uma questão de, digamos, estilo.

Cada marca de cigarro tinha a sua própria "personalidade", que tentava transmitir para seu público consumidor. Comecemos pela mais famosa: Marlboro. O sujeito que fumava Marlboro era macho, decidido, independente. Tudo traduzido em comerciais belíssimos com cowboys e cavalos. Venha para o mundo de Marlboro, dizia o slogan. Apesar de ser direcionado para o público masculino, muitas mulheres também eram seduzidas pela marca. Uma beldade sacando um maço de Marlboro da bolsa? Grrrrrr...



Os comerciais do Carlton eram sempre os mais sutis, direcionado a um público mais elitizado. Eu lembro de uma época em que nem os cigarros apareciam. Bastava a trilha sonora e as cores para associar ao produto

O Free já era outra história. Completamente o oposto do mundo dos cowboys machos. Havia sempre um toque de intelectualidade nos comerciais do cigarro Free. Mas nada acadêmico. Era completamente cool. Não foi atoa que virou patrocinador de um dos maiores festivais de jazz do Brasil, o FreeJazz Festival. Além disso, o Free vendia a idéia de um cigarro com baixo teor de nicotina. Cool, inteligente, descolado e com baixo teor. Essa era o Free. E o que os seus consumidores queriam ser.

Comentário de ex-fumante: depois de um tempo, esse cigarro dava um pigarro desgraçado. É triste, mas é preciso separar o glamour da realidade.

Comercial do Free: "Meu, tipo assim: mil coisas!". Papo cabeça, estilinho independente e contestador. Direcionado ao público jovem

A marca que eu fumava era um meio termo entre cigarros light e aqueles fortes. O L&M, da Philip Morris, vendia a idéia da vida na estrada. Os comerciais mostravam músicos de uma banda de rock em um ônibus pela rota 66, nos EUA. E eu que acha que fumava L&M só por causa da caixinha azul bonitinha... Havia ainda uma diferença entre os maços de L&M em formato de box e os normais. Mas isso só quem era usuário da marca vai entender.

Seria possível despender um bom tempo sobre as diferenças entre as marcas. Mas só para terminar, lembro do cigarro que tinha alguns dos comerciais mais bacanas. Pelo menos no quesito trilha sonora. O Hollywood era a dita marca que associava cigarros com esportes. Em geral com surf ou windsurf, snowboard, escaladas etc.

Comercial do Hollywood com cara de anos 80. Trilha sonora de Peter Frampton, edição de clipe de aventura e gente bonita. Parece até abertura da Armação Ilimitada (você precisa ter por volta de 30 aninhos pra ententer ou vá ao google)

O interessante do Hollywood é que na minha opinião ele nunca conseguiu ter muita entrada junto ao público jovem. Ele não era um cigarro barato, ou seja, não atuava na linha do Derby (salvação do fim do mês, já sem grana!) ou Campeão. Tanto em termos de preço quanto de teor de nicotina o Hollywood estava mais para o Marlboro. Mas ninguém teria problemas em sacar um maço de Marlboro na balada. Já um Hollywood...

Na minha opinião, o Hollywood ficou com o estigma do cigarro do paizão. Não por acaso, meu pai fumava Hollywood. Um cigarro para quem gostava de fumar um cigarro forte, com sabor encorpado, que tinha condições de pagar pelo produto, mas que não se importava muito com a marca ou com o status conferido pelas cores impressas no maço.

Outro do Hollywood, provando que aventura fumante pode ser no ar, no mar, na terra ou na neve. Trilha sonora da Tina Turner: sempre sons marcantes

Eu me lembro que a Souza Cruz, detentora da marca Hollywood, lá pelo final da década de 90, havia iniciado um marketing forte para mudar essa imagem, com propagandas mais ousadas e até uma reestilização do logo. Foi quando veio a proibição dos comerciais de cigarro na tevê, que depois se estenderam para outros meios.

Enfim, esse texto não tem nenhum caráter de pesquisa. É só um pouco do que eu lembro dos meus anos de fumante e da minha sempre curiosidade por comerciais.

1 comentários:

Anônimo disse...

Engraçado, é como se o governo se preocupasse com as pessoas proibindo os comercias de cigarro na TV. O imposto do cigarro no Brasil é o mais caro do mundo! Será que o governo ficaria feliz se todos parecem de fumar ao mesmo tempo? Será!

"Governo não dá ponto sem nó"